segunda-feira, 3 de novembro de 2008

LENDA DE DEU-LA-DEU MARTINS

O brasão de armas de Monção perpétua esta figura portuguesa do tempo das guerras de D. Fernando, Rei de Portugal, com D. Henrique de Castela, no longínquo século XIV: em campo branco uma torre, no alto da qual emerge um vulto de mulher, em meio corpo, segurando um pão em cada uma das mãos; em volta a legenda, Deus a deu – Deus o há dado.
Pois esta é a história de Deu-La-Deu Martins, a mulher do capitão-mor de Monção, Vasco Gomes de Abreu, e dos actos de bravura que fizeram dela a heroína desta vila nortenha.
Estava-se na época em guerra, como já disse. Vasco Gomes de Abreu ausentara-se em serviço do Rei de Portugal e por esse motivo o adiantado da Galiza, D. Pedro Rodrigues Sarmento, general de Henrique de Castela, resolveu aproveitar a ocasião para cercar a vila Monção com um poderoso exército. A vila aguentou o cerco apesar da falta de recursos de todo o género. Os alimentos eram escassos, os homens válidos para a defesa eram muito poucos. Deu-la-Deu assumiu o comando da praça e, durante todo o tempo que durou o cerco, dirigiu os seus homens, lutou a seu lado nos momentos de maior perigo, dando coragem aos vacilantes e desesperados, deu assistência aos feridos, fechou os olhos espantados de céu e dor dos mortos. Desmultiplicou-se, sem um momento de desânimo, sem fraquejar.
Porém, dentro dos muros da praça, esgotava-se tudo, lentamente: os recursos militares, a alimentação, os próprios homens e a também coragem. O desespero alastrava sobre espíritos e corpos dos massacrados defensores da praça por dias e dias de expectativa num lance decisivo.
E foi num nesses momentos de desespero que, lúcida, Deu-la-Deu mandou recolher a já pouca farinha que existia na vila para fazer alguns pães. Os olhos famintos e esbugalhados dos habitantes chisparam de ténue mas selvagem alegria. O pão, o último naco! Depois a morte, mas que interessa isso se ela nos espera na mesma e nós estamos fartos de a esperar!
Prontos os pães, Deu-la-Deu subiu à muralha com eles na mão. Chegou-se a uma ameia e atirou-os aos sitiantes, espantando os seus conterrâneos, sem forças para mais gritou bem alto:
A vós, que não podendo conquistar-nos pela força das armas, nos haveis querido render pela fome, nós, mais humanos e porque, graças a Deus, nos achamos bem providos, vendo que não estais fartos, vos enviamos esse socorro e vos daremos mais, se o pedirdes!
Na verdade, também o inimigo tinha muita fome. Por isso, face àquele desperdício de pão, acreditaram que existia fartura entre os sitiados e levantaram cerco, partindo para terras de Espanha.

1 comentário:

alfacinha disse...

mas que história interessante. Não tinha conhecimento de tal acontimento e desfecho. Em parte faz-me lembrar de uma história no livro de 2 Reis, julho eu capítulo 6 e 7. Se puderes lê quando tiveres tempo. Mas obrigado por este pedaçinho de história de Portugal. Um forte abraço deste amigo e irmão.